terça-feira, 13 de janeiro de 2015

NÃO EXISTE MANUAL DE SOBREVIVÊNCIA

Diagnóstico comprovadíssimo, sintomatologia cada vez mais aparente, tratamento iniciado, baseado principalmente no uso de dopamina, a tal substância que o meu querido cérebro não produz mais e que é a chefona que  determina o controle do meus movimentos.
Mais três comprimidos ao dia e os tremores das mãos, principalmente da direita, diminuíram sensivelmente, mas ainda assim, meu marido abortou minhas pretensões de ser uma "chef de cuisine". Picar uma cebola podia significar uma tentativa de suicídio. Lavar a louça também passou a ser tarefa dele, afinal quebrar louças virou meu esporte favorito.
Hoje faço as tarefas caseiras menos minuciosas, as que não exigem tanta delicadeza, mas para isso tenho que me abster de tomar o Prolopa pela manhã. Não sei avaliar se porque já tomo uma série de outros remédiospsiquiátricos nesse horário, o caso é que me bate um sono absolutamente fora de hora e minha única solução é voltar para cama. Então passei a me medicar ao meio dia, pois então posso almoçar e finalmente tirar uma soneca da beleza.
Aos poucos fui percebendo outroscomprometimentos. Sempre tive uma letra bonita e escrevo muito, mas agora minha letra começou a se tornar anã. É o que se chama de micrografia. Começo a escrever que é uma maravilha, mas então as letras vão diminuindo, ficando nanicas e quase ilegíveis. Abandonei a caneta e agora só uso o computador. Aqui elassó ficam pequeninas se mudar a fonte.
Ano passado resolvi que tinha que sair em busca de outras alternativas,além dos medicamentos. Resolvi fazer academia, junto com meu marido. Comprei umasroupas supimpas e assim, toda paramentada comecei a frequentar umas das melhores academias da cidade. Lá, além da malhação, teria também um atendimento fisioterápico. No começo foi tudo muito bem. Tudo era direcionado aos meus problemas, que infelizmente não se resumem só ao Parkinson. Além do "alemão" tenho três hérnias de discos cervicais (pense se sequer cogito a possibilidade de operá-las?) e também duas sacro-lombares. Porém quando  saí do sistema "for you", onde praticamente tinha uma "personal trainner" , a tragédia se deu. Todos os dias tinha professores diferentes, que embora sempre fossem muito atenciosos e comumente se inteirassem dos meus casos, parecia-me que eles estavam mais interessados na parte estética do que nos meus problemas físicos. Lógico que eu desejava ardentemente perder aquela barriguinha indesejada e arrumar minha postura, que aos poucos vai me levando para a frente.
Então tá, vamos fortalecer a musculatura lombar, estufar o peito (que também  já sofre a ação degradante da gravidade), encolher a pança e elevar o bumbum para bem longe das minhas costas.
Bastou uma aula e uma caminhada para ficar quase paralítica. As dores eram imensas, quase não podia mais andar. Eu estava bem arranjada, só me faltava uma cadeira de rodas.
Mais sessões de fisioterapia, massoterapia e mais remédios, analgésicos que geralmente me são proibidos, pois também tive um tumor no estômago e não é qualquer coisa que posso tomar.
Desisti da academia, aposentei meus lindo trajes, pelo menos por enquanto, pois ainda não estou completamente livre das dores.
A medicação para diminuir os tremores surte um efeito razoável, em compensação, a falta de equilíbrio e o trançado bêbado das pernas se acentuaram. Precisava de outra medicação que desse conta desses agravos. Também percebi que minha fala começou a se modificar e lá vou eu para a fonoaudióloga. Mas descobri com o tempo que essa dificuldade se acentuava mais quando por alguma razão ficava nervosa. Se estava em calmaria avoz também ficava normal. Decidi parar com a fono, minha vida estava se resumindo a um ir e vir constante a consultórios e como não dirijo e moro longe, fico sempre a depender da disponibilidade de horários do meu marido. E vamos combinar, para ele se tornar um escravo de verdade, só falta eu montar um pelourinho na varanda. Carta de alforria? Só se nós nos separamos.
Até agora tenho me detido à parte física, à dependência e inutilidade que ela me causa. Mas e a parte emocional? Ela conta, e muito, talvez até mais do que a falta da capacidade motora.
No início, sentia muita vergonha de me expor, de sair, o que aliás raramente faço sozinha. Uma simples ida ao shopping ou descer uma escada é um ato de coragem. Calçadas então, são verdadeiras armadilhas, estou sempre correndo o risco de ser caçada por uma buraco ou um desnível que me leve a me estabacar no chão feito uma fruta podre.
Incompreensivelmente, sinto-me mais segura andando de bicicleta, porém só uso deste recurso por aqui, pelo meu bairro, onde o trânsito ainda é um pouco mais tranquilo que a região central. Meu maior problema é subir e descer da "bike", que já é de um tamanho menor do que a recomendada para um adulto. É comum ficar entalada. As pernas se recusam a me ajudar e geralmente preciso de auxílio.
Semana passada vivi uma situação bem desagradável, que no primeiro momento me fez ir àslágrimas, mas que depois me fez rir, o que aliás é um bom remédio. Auto-piedade em nada resolve.
Precisei sair a pé. Me marido estava no hospital acompanhando meu sogro que havia sofrido um infarto. Por aqui não passa um miserável de um ônibus (quem diz que Balneário Camboriú é um paraíso?) que me levasse pelo menos até próximo do destino. Fui corajosamente e muito lentamente  caminhando, tentando controlar os meus pés. Táxi? Nem pensar, simplesmente eles são poucos por aqui. Na volta, a mesma situação, além da dificuldade de enfrentar sozinha as calçadas ainda tinha que ter a cabeça torrada por um sol inclemente. Em certo momento,não aguentando mais, optei por chamar um moto-táxi, desses que trazem consigo um capacete que pode lhe fazer nascer uma ninhada de piolhos. O motoboy já ficou meio apreensivo ao se deparar comigo, que ainda, desgraças das desgraças, estava de vestido. Subir numa moto é uma ato heroico. Primeiro tenho que tirar os óculos, pois óculos e capacete não se ajustam, então fico cega. Talvez isso seja bom, assim me impede de ver as manobras violentas que eles costumam fazer no trânsito. Para subir , sentar, achar o apoio para os pés é óbvio que necessito de ajuda e o rapaz foi bastante prestativo, inclusive ajeitando meu vestido para que meu bumbum não ficasse exposto.
Mas ao chegar em casa, como fazer para descer? Precisei da delicadeza da zeladora do prédio, que junto com o motorista me içou. Me pegaram literalmente pelas pernas e braços e me colocaram em segurança em terra firme. Sentei-me na calçada e deixei as lágrimas pularem para fora de meus olhos.
Depois de passado o vexame, ri a não mais poder, fiquei imaginando a cena ridícula, mas infelizmente necessária e se alguém me viu, dane-se, já há muito mandei a vergonha para aquele lugar que você sabe muito bem onde é.


PS: QUERIDOS LEITORES, DESCULPEM ALGUNS ERROS, QUE NÃO SÃO DE ORTOGRAFIA, MAS SIM DESTE COMPUTADOR. SE ERRO UMA PALAVRA OU ESQUEÇO DE DIGITAR UMA LETRA E APERTO A TECLA DELETE PARA CONSERTAR, VAI APAGANDO TUDO. ENTÃO SÓ ME RESTAM DUAS OPÇÕES: OU REESCREVO OU DEIXO AS PALAVRAS COLADINHAS. OPTEI, POR PURA PREGUIÇA, PELA SEGUNDA. VOU TENTAR RESOLVER O MAIS BREVE POSSÍVEL

Nenhum comentário:

Postar um comentário